quinta-feira, 10 de março de 2016

A Educação Marxista - A praxis contra a Verdade


Para o marxismo, a prática tem prioridade sobre o conhecimento e é o fundamento de todo o conhecimento. Essa é uma tese de Marx, que seus epígonos não hesitaram em manter, e que é a própria base do marxismo: a primazia da praxis sobre o conhecimento, da ação sobre a doutrina e do fazer sobre o ser.

A conseqüência imediata dessa tese no ensino é a de que, para o marxismo, “educar não é pôr em contato com a verdade e sim com a prática”. Mao-Tsetung afirmou que uma das características do materialismo dialético “é o seu caráter prático; sublinha a dependência da teoria à prática; que a prática é a base da teoria; que o critério da verdade nada mais é que a prática social”.

A educação e o ensino, para o marxismo, devem realizar, na prática, a vinculação do homem ao sentido da História. “A educação é necessária e seu significado e sua tarefa consistem em provocar a máxima aceleração no processo histórico e fazer possível a transformação da consciência dos homens”.

Para o marxismo, a única forma possível de educar consiste em lograr que consciente e livremente – falamos de liberdade marxista – o educando se realize, por contradições sucessivas na natureza e na história; “a educação marxista deve ser interpretada como acomodação...a educação é uma atividade acomodadora à situação revolucionária...educar é socializar”.

O professor desempenha papel importante e “é fundamental que o ensino esteja em mãos de professores ideologicamente doutrinados e capacitados para acender a chispa da consciência comunista em seus alunos e, ademais de uma formação adequada, deve ter, acima de tudo, uma consciência política. A Escola e o Ensino devem estar permanentemente controlados para evitar a infiltração de resíduos e concepções burguesas”

É esse o objetivo da educação marxista: formar consciências comunistas.

E isso, como é obtido?

O procedimento varia segundo as circunstâncias. Não é o mesmo quando o marxista esteja no Poder, ou quando ainda não tenha conseguido a tomada do Poder. Quando domina a sociedade todos sabem como opera e, no outro caso?

Em primeiro lugar devemos ter em mente que o marxismo não trata de melhorar nada, e sim fazer uma transformação total, face ao seu próprio caráter dialético. A crítica do marxismo a toda a injustiça real ou a toda situação que se apresente como injusta, ou que se faça passar como tal, não tem por finalidade restabelecer a justiça ou melhorar as coisas em seu melhor e mais amplo sentido, e sim inserir o homem na dialética, lograr que os homens aceitem sua vinculação ao processo dialético, que é aquilo que, para o marxismo, constitui o progresso.

O marxismo não se preocupa com o proletariado porque ele esteja oprimido ou porque seja débil, e sim na medida em que é uma força, e quanto mais proletários existirem maior será sua força como classe revolucionária e mais próximo possível estará o socialismo.

O objetivo confesso dos marxistas é a tomada do Poder pela classe trabalhadora. Isso, todavia, não significa que nada se possa fazer antes que o Poder passe às mãos dessa classe. A luta pela melhoria da educação tem uma importância fundamental, pois sem a dedicação a essa luta não podem tomar forma e desenvolver-se nem os meios para tornar possível a ofensiva final, nem a ideologia que sustenta essa luta.

Daí a importância e o perigo do marxismo nos centros escolares da sociedade em que este ainda não tenha assumido o Poder. Perigo mais latente e real hoje, quando a doutrina comunista pretende chegar ao final da história – comunismo – por meio da conquista da sociedade civil, o que tornaria possível a subseqüente conquista do Estado. Ou seja, a conquista da sociedade civil como prelúdio da conquista da sociedade política, pois, conforme a terminologia de Gramsci, “antes de tomar o Poder é preciso conquistar a cultura”.

Exemplo clássico de derrota do marxismo, por não possuir a hegemonia na sociedade civil, foi a sofrida por Salvador Allende, no Chile, em 1973.

Antonio Gramsci, ideólogo marxista italiano, falecido na década de 30, e seus seguidores eurocomunistas, descartam, por esse motivo, a violência revolucionária – que, no entanto, admitem, em último extremo – e dão mais importância à educação levada a cabo pelos intelectuais, considerando-a o principal fator revolucionário. Desse modo pretende-se evitar que a forte personalidade da sociedade civil nos países ocidentais se rebele contra o governo revolucionário, levando-o ao fracasso, como ocorreu com Allende.

É impossível que uma luta política possa culminar em verdadeiros resultados se não vier acompanhada de ma revolução, de uma reforma intelectual e moral, se não se modifica a mentalidade das pessoas e, por conseguinte, a superestrutura da sociedade. Por isso, o problema da revolução é, também, um problema de educação.

Daí a importância da Escola – na qual a política, a cultura e a pedagogia estão indissoluvelmente unidas – que poderá vir a cumprir, com relação aos jovens, o mesmo fim que um partido político.

Por tudo isso – ainda, segundo Gramsci, a difusão, desde um centro hegemônico – a Escola – de um modo de pensar homogêneo, é a principal condição para a elaboração de uma consciência coletiva.

Direção, organização da cultura, centro hegemônico, modo de pensar homogêneo, consciência coletiva, escola unitária, tudo isso é destinado a impor que se assimile a filosofia da práxis. Isto é, o marxismo, pela chamada sociedade civil.

No fundo, no entanto, nada mudou. Trata-se da instrumentalização da cultura e do ensino para atingir o objetivo visado pelo marxismo: a submissão do homem, mediante a submissão da inteligência.

Volodia Teitelboim, que foi membro da Comissão Política do Partido Comunista Chileno durante o governo Allende, referiu-se ao tema abordado neste artigo na Revista Internacional número 1/1982: “Quem controlar a cultura e sua base imprescindível, a educação, poderá não só definir retrospectivamente o acontecido como também controlar o futuro”.



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Carlos I. S. Azambuja é Historiador.

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