O resultado é que,
de acordo com qual parcela social à elite intelectual convém arbitrariamente
proteger, a “classe” defendida consegue um salvo-conduto.
Por Hiago
Rebello, publicado no Instituto Liberal
“Algumas ideias
são tão estúpidas que apenas um intelectual poderia acreditar nelas”.
— George Orwell.
Recentemente, como
ocorre de tempos em tempos, uma onda de violência e assaltos percorreu a cidade
do Rio de Janeiro, acarretando confusão, feridos, perdas materiais, medo e
correria nas ruas e praias do que foi um dia a Cidade Maravilhosa.
Pessoas que saem de
suas moradias para assaltar e humilhar quem trabalhou e lutou para ganhar seu
dinheiro e comprar seus celulares; sujeitos que despontam de suas comunidades e
sequer têm a mínima noção de respeito, ordem e zelo para com a sociedade que os
envolve; indivíduos que riem, debocham e agridem pessoas de bem, que
possivelmente não fizeram mal a ninguém em suas vidas. Atacam trabalhadores,
insultam os honestos que querem apenas caminhar em uma praia ou andar em um
ônibus em paz.
Mas quem teria a
coragem de defender os errados, e pior, colocar a culpa nos certos? Quem
poderia ter a capacidade de acudir o ladrão e inverter os papéis, colocando a
culpa no assaltado, justamente apenas por ter algo material que os criminosos
não possuem? Os únicos capazes de cometer tal estupidez, talofensapara
com as crenças e valores que todos os brasileiros de bem possuem, são os intelectuais.
A palavra
“intelectual” geralmente possui uma conotação positiva. Pessoas com um
intelecto acima da média em várias áreas, geralmente nas de humanas, detém
certo prestígio social desde tempos remotos. Embora tal termo seja bem recente,
a ideia por trás dele existe desde o início da humanidade. Sábios, anciãos,
profetas, sacerdotes, sofistas, filósofos, médicos, advogados, jornalistas,
historiadores, etc., além de uma vasta gama de pessoas que se podem considerar
intelectuais graças à auréola dourada que a sociedade dá para os mais aptos e
diversos nos campos do intelecto.
A conotação positiva
de homens versáteis e eruditos existe até hoje, mas não significa que é
impossível perverter esta acepção. Quando certos indivíduos detêm alguma alta
gama de estudos e leituras, independente do que quer que acreditam, a maioria
da sociedade irá olhar para o que aparentam ser, isto é: pessoas
com um alto gabarito, vestidas de maneira adequada para suas posições, diversos
livros em suas estantes, um vocabulário chique, uma capacidade para conversar
sobre diversos e complexos temas, etc., mas irão ignorar o que, no
fundo, tais intelectuais defendem e acreditam.
Intelectos que
militam e argumentam em prol da degeneração total das percepções evidentes, dos
arranjos sociais, das tradições em geral, e até mesmo da Razão e da Verdade [1], infestam as academias. Entre tais
parasitas acadêmicos, estão aqueles que, vendo uma situação grave e violenta
ocorrendo na sociedade, separam-na em níveis quase que intransponíveis para
julgar de acordo com o nível social adequado, colocando em absoluto o estado de
cada divisão de classe – determinando qual é a oprimida e qual é a opressora,
quem são os malvados e quem são os bons, quem é culpado e quem é
inocente – e descartando todo e qualquer outro parâmetro de análise.
Em resumo: agem com uma arbitragem pré-moldada ideologicamente, aceitando
problematizações apenas dentro de tal pré-moldagem ideológica e reducionista.
O resultado é que,
de acordo com qual parcela social à elite intelectual convém arbitrariamente
proteger, a “classe” defendida consegue um salvo-conduto. Uma vez que, de
acordo com o sistema ideológico de esquerda, pessoas pobres que roubam só
furtam porque faltaram, devido à desigualdade social, de oportunidades e a que
a mesma desigualdade é fruto de uma sociedade alienada, de alguma forma, pela
burguesia, a culpa não cai mais sobre o agressor, sobre o ladrão, mas sim em
cima de quem trabalhou para comprar um iPhone6, por exemplo. Quem tem dinheiro
para comprar um iPhone acaba por incentivar o roubo porque esbanja um sucesso
material que o outro não tem, além de colaborar com a ideologia burguesa e
consumista.
O perigo de tais
discursos é evidente, principalmente quando se tem o Brasil como um cenário.
Dado que os mesmos intelectuais formam a juventude nas universidades, sendo
essa massa de jovens os futuros profissionais em áreas como jornalismo e
direito, as ideias classicistas à esquerda, além de penetrarem mais ainda na
sociedade, fomentando o crime [2] e o ódio para com pessoas mais
abastadas e de pele mais branca, podem criar fórmulas jurídicas e pressões
midiáticas contra uma sociedade que não quer ser mais assaltada e humilhada.
Fora das
universidades, não são poucos os blogueiros e os formadores de opinião que
encheram a internet de discursos afirmativos. Assim como aumentam o incentivo
para construir uma sociedade sem o que chamam de “opressão”, criada pela
desigualdade, os gênios acrescentam que essas parcelas mais “oprimidas”
historicamente se desliguem dos valores e partam para uma busca desenfreada
pela “luta de classes”. Um assaltante, ou um assassino, além de estar inibido
da culpa [3], está participando da velha luta de
classes, que é, para tais intelectuais, necessária para a sociedade.
O “porém” é que
todos esses problemas, criados e incentivados para desestabilizar o corpo
social, irão causar consequências – como bem demonstrou Richard M.
Weaver, as ideias têm suas consequências [4] –. Quando as ondas de crimes formarem
padrões difíceis de conter, mas fáceis de perceber, quando o judiciário se tornar
quase incapaz, e a polícia for literalmente sinônima de atraso e retrocesso, quem
poderá parar as ondas de crimes? Se a força usada para prever
e deter o crime é algo ruim, produto de uma sociedade fascista
precisando ser desconstruída, será que aceitarão a força do soco de
um criminoso, quando chegar a vez dos intelectuais de perder seus celulares e
suas carteiras?
Se houver um
progresso das ideias estúpidas, quem pagará a conta? Em quem cairá a culpa pela
violência estar aumentando e a impunidade se tornar algo tão comum quanto andar
pela rua? Para quem o povo, finalmente, irá olhar e culpar por conta
das mazelas que sofre? Por conta da humilhação, das perdas materiais, dos
insultos, das enganações, dos familiares, parentes e amigos perdidos?
A esquerda pode até
tentar pedir mais e mais comida, no restaurante que é o Brasil, tentando evitar
pagar a conta, mas é sabido que isso além de ser inútil, apenas agrava a
situação. Uma hora a conta chega, todavia, graças aos esforços de intelectuais
dessa vez chegará do jeito que a esquerda sempre amou: no vermelho do
sangue dos inocentes. Ao pagar a conta, o esquerdismo progressista perderá
todo o seu prestígio, toda sua moral, mas o custo, infelizmente, também será do
Restaurante Brasil, que por décadas aceitou tal disparate – muitos inocentes
irão sofrer e morrer graças às universidades e aos tão prestigiados
intelectuais.
___________________
[1] Alguns
dos gurus da irracionalidade chegam ao ponto de afirmar que tudo é uma
“construção social”, admitindo que seu próprio argumento seja um constructo,
mas ainda assim o utilizando para tentar refutar seus debatedores, tendo a
total falta de capacidade de perceber que seu argumento é contraditório ou
irrelevante se for rigorosamente aplicado. Muitos flertam até mesmo com a
desconstrução da própria noção de “intelecto”.
[2] Infratores
irão usar dos jargões universitários para se defenderem. Vão justificar seus
roubos porque são pobres e não é justo ver alguém mais rico e com mais coisas
que eles, porque são negros e os pais de seus trisavôs eram escravos, por isso
necessitam da prestação de conta da dívida histórica… Crimes serão justificados
pelas finanças e pelo passado distante.
[3] Uma
vez que a culpa não é apenas dele, e sim de todos, segundo a esquerda. Quando a
culpa é diluída em uma massa genérica, isto é, a “sociedade”, ela acaba sendo
de todos e, como consequência, de ninguém.
[4] Weaver,
Richard M. As Ideias têm suas Consequências. São Paulo: É
Realizações, 2012.
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