(Manoel Marques/VEJA)
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Empreiteiras envolvidas agiam em sintonia com o Instituto
Lula. Documento mostra que até as explicações da Odebrecht, que pagou 1 bilhão
de reais em propina, eram combinadas com a entidade
O sobrado de dois andares que aparece nas páginas que abrem
esta reportagem nem de longe lembra um palácio. As aparências, como sempre,
enganam. Nele funciona desde 2011 o Instituto Lula, entidade concebida pelo
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para servir de plataforma à sua atuação
política após deixar o Palácio do Planalto. Pelo menos no papel, os planos de
Lula para seu instituto eram o mais ambiciosos e altruístas possível. A
entidade foi concebida para funcionar como um centro de integração da América
Latina, um pilar para fortalecer a democracia nos países em desenvolvimento e
ajudar a acabar com a fome na África. Tudo muito nobre, se por trás dos
objetivos messiânicos não estivessem os empreiteiros envolvidos no escândalo da
Petrobras. As investigações da Polícia Federal já revelaram que o dinheiro
desviado da estatal financiou o funcionamento do instituto. Além disso, fica
cada vez mais evidente que o ex-presidente Lula acabou usando sua influência
no Brasil e no exterior para fomentar os negócios de criminosos - e ganhou
muito dinheiro com isso.
A favor do ex-presidente há o fato de que ele pode ter agido
com as melhores intenções - enganado pelos seus contratantes, sem saber a
origem do dinheiro que foi doado pelos empresários ao seu instituto. Ao fazer
lobby para as empreiteiras no exterior, estaria pensando exclusivamente no bem
do Brasil e nos milhares de empregos que poderiam ajudar a aplacar a miséria do
Terceiro Mundo. Se isso for verdade, ele era o único bom samaritano da
história. Na semana passada, os procuradores que investigam o petrolão
denunciaram as cúpulas das empreiteiras Andrade Gutierrez e Odebrecht. Esta
última, a maior do país e uma das maiores do mundo, por crimes de corrupção e
lavagem de dinheiro. Os dados que sustentam a acusação são estarrecedores. A
empreiteira movimentou mais de 1 bilhão de reais em contas secretas no
exterior. Parte desse dinheiro, descobriu-se, foi usada para subornar diretores
da Petrobras.
No ano passado, Paulo Roberto Costa, ex-diretor da estatal,
contou em sua delação premiada ter recebido 23 milhões de dólares em propina
paga pela Odebrecht. Era sua parte, a menor, na ampla rede de distribuição de
subornos em troca dos milionários contratos da Petrobras. A empreiteira negava.
Seguindo o dinheiro, os investigadores descobriram que a companhia abriu uma
série de empresas de fachada no exterior para esconder os pagamentos de
propina. Na sexta-feira, o juiz Sergio Moro decretou pela segunda vez a prisão
preventiva de Marcelo Odebrecht, Alexandrino Alencar e outros executivos da
companhia. A nova ordem de prisão teve por base informações bancárias remetidas
ao Brasil pelas autoridades suíças que não deixam dúvidas de que a maior
construtora brasileira está envolvida até o pescoço no escândalo de corrupção
da Petrobras.
Na semana passada, a Polícia Federal também anexou ao
processo anotações encontradas nos telefones apreendidos com Marcelo Odebrecht
e documentos apreendidos com os diretores da empreiteira. As notas mostram que
o empreiteiro, diferentemente do que vinha sustentando, não só tinha
conhecimento como exercia controle sobre as atividades paralelas da empreiteira
no petrolão, incluindo a estratégia para tentar melar a investigação. Nas
anotações constam cifras, nomes de figuras importantes associadas a cifras, obras
associadas a cifras, contas na Suíça - provavelmente as mesmas agora
descobertas pelos investigadores. Em uma das anotações, Marcelo insinua que as
contas suíças abasteceram campanhas políticas, entre elas a da presidente Dilma
Rousseff. Muito ainda precisa ser investigado.
Há outra evidência importante que eclode dessa parte da
investigação: a parceria que havia entre a Odebrecht e o Instituto Lula. Uma
troca de mensagens interceptada pela Polícia Federal e juntada na semana
passada ao processo da Lava-Jato ilustra bem a relação entre a entidade
beneficente do ex-presidente e a empreiteira que corrompeu metade da diretoria
da Petrobras nomeada por ele. Na origem da troca de mensagens está uma lista de
perguntas enviadas por VEJA à companhia sobre os pagamentos feitos ao ex-presidente
e a seu instituto. A Lava-Jato tinha acabado de revelar que a Camargo Corrêa,
outra empreiteira flagrada no petrolão, havia repassado 4,5 milhões de reais a
Lula. Uma parte do valor, 1,5 milhão, foi paga diretamente à LILS, empresa de
palestras e eventos aberta pelo petista. E a outra parcela, de 3 milhões,
seguiu para contas do Instituto Lula. Curiosamente, um dos depósitos foi
anotado na contabilidade da Camargo sob a rubrica "bônus eleitorais".
Como já se sabia que a Odebrecht também havia dado dinheiro a Lula, VEJA
perguntou à companhia os valores e a justificativa para tais pagamentos.
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